sábado, 26 de dezembro de 2015

Onde está...

No silêncio da noite o frio é tão intenso.
Arrefece as mãos, a alma e o sentido.
E eu penso em ti! Aí: escrevo por extenso
uma saudade que volta em hábil gemido .

Saudade do teu beijo. Sonho traquino!
Nas mãos a sombra de um caso esquecido.
Perdido no luar de então! Num inverno
 nostálgico através do vento gélido.

Só ele varre a noite amiúde! Porque será
visão de pouca dura… E eu onde estou?
_Sentada no descair do tempo!_ Que saberá,

de mim e de ti. Parca paz centrada
no impossível. Pássaro alado que voou,
e nas asas levou o sorrir da primavera.



sábado, 19 de dezembro de 2015

Olha Por Nós...

Preciso conversar com o firmamento…
Numa conversa serena ao nascer do dia.
Falar dos pobres, dos fracos, da razia,
por que passam as almas neste tempo.

 E de todas as dores e do seu lamento.
Nessa conversa: pedirei a Deus e a Maria.
Que cubram a terra de paz e de alegria.
É Natal: que cesse finalmente o pranto,

de todas as crianças que não podem brincar.
Peço também a Jesus._ Olha por todos nós.
Almas sem lei, moinhos despidos de Mós!

Num grito de alerta preciso afirmar.
_Está o mundo imundo, de uma luta feroz.
Por isso meu Deus te peço. _Olha por nós.




quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Espera...

Espera por algo… mas que força traz à tona
nas três palavras singelas. _Espera por mim.
Na solidão dos campos a espera é maratona,
ergue até altos muros. Um horizonte sem fim!

A aridez desta espera, onde a mesma desespera,
faz da força de vontade: Um bosque jasmim!
Espera por dias melhores… O sonho impulsiona,
mil estrelas de cupido, num ramo de alecrim!

Sou tolhida p`la vontade que retrai a ansiedade.
Solta numa nuvem branca… Até o chamamento
do céu que cobre a terra é breve claridade.

Atrai saltitantes emoções nas asas do vento…
Mas a espera é cruel! E na franca anuidade:
_Esquece que até ela intui ao esquecimento!



domingo, 6 de dezembro de 2015

A voz da consciência (Conto que podia ser de Natal)…

A voz da consciência (Conto que podia ser de Natal)…


_ Preciso fazer alguma coisa para não enlouquecer…
Olha a rua através dos vidros entreabertos, e repara numa cadeira de rodas que desliza vagarosa pelo passeio fronteiriço. O seu olhar podia prender-se no homem de meia-idade, sem pernas, que encontrou na cadeira o seu meio de locomoção. Mas não: Jamais repararia no homem, afinal toda a sua existência foi comandada pelo ´´ter`` sempre mais e mais, nem que fosse o esqueleto que agora a atormenta!

  _ Que queres tu? Logo tu que encontraste na opulência o meio de vida!

A voz masculina soou tranquila, de uma tranquilidade aparente, é certo! Enquanto o seu íntimo fervilhava de asco.
Digo bem asco: apesar de ser seu amigo, ainda assim, por vezes atreveu-se a criticar-lhe os devaneios… Como se chamar devaneios a verdadeiras aberrações, que normalmente colocavam a vida dela e daqueles que a rodeavam em causa, fosse normal.
Mas também: Como se a normalidade fizesse sentido, ao olhar agora o seu rosto enrugado!

  _Os retalhos da minha vida assemelham-se a marionetas, e dançam tresloucada mente no meu passado. Por acaso isso é pecado? 

Ou é impressão, ou ele juraria que está prestes a chorar. Conhece-a desde criança e já nessa idade era difícil algo ou alguém arrematar-lhe uma lágrima.

  _Manipulaste tudo e todos em redor, e foi assim uma vida inteira. Ainda recordo como se de hoje se tratasse: O dia em que encenaste a tua morte. Tinhas quando muito vinte anos, nunca cheguei a saber onde foste buscar a morta…

  _Qual morta, mas quem é que morreu?

  _Esquece, afinal de que serve remoer recordações, e as que tenho contigo são os meus pecados. Mas podes chorar, vamos chora verás que não dói. Ou melhor, quando se chora só a alma dói.

 Vira-lhe as costas há setenta e cinco anos que a olha de frente, mas está cansado, tão cansado que só lhe apetece dormir.
Ensaia a retirada, mas por um breve instante fica indeciso. Qual o caminho a escolher? Se subir os degraus tudo será fácil, mas a facilidade sempre foi o jogo dela, contudo se retorcer e sair pelos fundos, sabe que daqui em diante nada será igual, olha-a novamente de soslaio…
Pressentindo a sua indecisão ela ri a bandeiras despregadas, e a sua voz deixa transparecer o desprezo por tudo aquilo que lhe começa a ser sagrado.

 _Sempre te vi como um frouxo e sempre me deitastes as culpas por assim ser. E como te disse preciso fazer alguma coisa para não enlouquecer.

Novamente fixa o olhar na cadeira de rodas e finalmente repara no homem de meia-idade.

 _ Chega aqui.

Como que movido por um telecomando, ele aproxima-se da janela.

 _ Reconhece-lo?

  _Sim, quando era novo tinha imensos sonhos.

  _Não me digas que a culpa foi minha.

É ele que agora começa a chorar, as lágrimas caiem em cascata e tornam o seu rosto ainda mais velho e enrugado, enquanto ela continua a rir e vai desfiando num rosário frio e calculista, palavras cruas mas ao mesmo tempo certeiras no propósito.

 _Soube-te bem as mordomias, a vassalagem com que te olhavam e obedeciam, acima de tudo soube-te bem o dinheiro. Ah! O bendito dinheiro, também te satisfazias sempre que mentias por mim, sempre que olhavas o mundo de um patamar mais elevado. Mas olha agora para ele: Não passa de um pobre coitado!

 _Cala-te de uma vez por todas. Grita e dá três passos atrás saindo pela porta dos fundos!

”””

 É de manhã quando abre os olhos. Não! Não é manhã: A claridade vem de uma lâmpada que pende sobre a sua cabeça. Atarantado olha em redor mas tudo lhe é estranho, estranha sobretudo a luz fria da lâmpada que o deve ter cegado durante toda a sua vida...

 _Está a acordar! Novamente é uma voz de mulher que o traz à realidade.

 Ao que parece há mulheres por todo o lado neste dia!

 _ Senhor Alberto está a ouvir?

Abre e fecha a boca, mas nada de prenunciar palavra, como é possível se ainda há pouco falava a bandeiras despregadas!

 _Bem-vindo de volta senhor Alberto, sabe que dia é hoje?

Não lhe apetece responder, quer lá saber de que dia se trata se hoje é o primeiro dia do resto da sua vida!

Passaram cinco anos desde o terrível acidente que o atirou para uma cadeira de rodas, e hoje no dia em que faz cinquenta anos tem uma enorme esperança no futuro. A reviravolta que a sua vida sofreu fez-lhe ver que muito mais importante que estatuto é ser-se feliz, e contribuir para que os outros o sejam também. Com o acidente que quase o levou para debaixo da terra soterrou hábitos obsoletos. Passou a dar menos importância a bens materiais para se debruçar sobre os bens da alma. Finalmente pode dizer que é um homem realizado, e o caricato está na estranha conversa que teve com a sua consciência há cinco anos atrás. Até então quem o conhecia afirmava que não tinha consciência, mas estavam enganados. Lá ter consciência, ele tinha, distorcida, mas tinha!
Afirmaram na altura que esteve em morte cerebral… Uma grande peta é o que é.
Como pode ter morrido mesmo que por breves instantes, se se lembra tim-tim por tim-tim de toda a conversa. Hoje rodeado de amigos recorda também a frieza da escada que esteve prestes a subir, o que o deixa a pensar na força que o fez voltar para trás…
 Passados estes cinco anos lamenta sobremaneira não poder falar dessa conversa com ninguém; ou ainda corre o risco de lhe chamarem doido. À semelhança de quando ofereceu o casarão onde morava para que nele fizessem um lar para os Sem-abrigo. Por essa altura foi morar no pequeno apartamento de solteiro, onde hoje comemora o seu aniversário.
Foram imensos os pretensos amigos que o intitularam de senil e assim se afastaram um a um, imagina se tivesse contado a alguém que falara com a sua funesta consciência, enquanto esteve morto, e ainda por cima se tinha visto com setenta e cinco anos!
Não tem saudades da sua existência antes do acidente, nem dos pretensos amigos que desapareceram, ganhou mais do que perdeu. Sobretudo respeito, ao invés de medo e bajulação, assim como passou a ter em redor verdadeiros amigos, e mais dia, menos dia, irá partilhar com eles o que realmente incentivou a mudança na vida de até então.
Sorri ao ter a certeza de que o acidente que quase o atirou para a morte, o tornou num homem melhor, onde finalmente a sua consciência o alerta para o que está bem ou mal, sem malabarismos ou interesses.
Pode dizer em tranquilidade que coabita em paz com a sua consciência.

                                                      Fim 


Um conto de Antónia Ruivo, de 2014

sábado, 5 de dezembro de 2015

Não te sei...

Sem tempo para dizer, bom dia.
E o dia não pára!
Sem tempo para sorrir.
E todos os sorrisos são iluminaria!
Sem tempo… Onde o tempo escasseia,
e a vida corre aflita na busca da eternidade.

Que é de ti e de mim?
Ou dos sonhos repartidos numa noite de luar,
que é da força que une as bocas?
Precisão inabalável ao cair da tarde!
Se o tempo deixou de ter importância;
enquanto escondo que não te sei.






quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Pouco é calabouço...

O morno de uma palavra sabe a tão pouco.
E o meio-termo delimita horizontes.
Só no reflexo de um grito astuto e rouco,
se libertam as asas que galgam montes.

_Que gritem: Vai o poeta nu deve ser louco!
Se ele augura enquanto bebe nas fontes.
_Sabem: muito é demais, pouco é calabouço.
E um verso deve ser ousadia, edifica pontes.

_Então: Porque se perde tempo que não há?
No frouxo de um pensamento assim – assim.
Quando num mundo cruel e ao deus dará,

impera a frieza da mordaça, impondo o fim.
Ao último dos poetas… Ou não fosse liberdade:
A rima nas asas de um poema em frenesim.

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo