quarta-feira, 28 de maio de 2014

Que faço...

Que faço com o presságio do vento
Auspicio nas nuvens, anunciado
Que faço diz.
Sempre que me chega o eco
Lamento que do teu peito vaza
Labaredas de raiva, moinhos de vento
Simbiose daquilo que não é.

Que faço?

Sigo a estrada mesmo com curvas
Sento-me numa valeta qualquer
Ou então.

Afasto o ímpeto e deixo entrar o sol.

Que faço?

Se te sei na dor do imprevisível
Numa caverna sem luz
Que a morte traz.

Sigo caminho, tal como antes
Em que um dia chegou
Presença marcou.

E o dia assomou.


Contigo...

Contigo perdi os sonhos e a capacidade de inventar
Até deixei para trás a vontade de explorar
Num amor aos tropeções embrenhei-me no chorar
Perdi tudo Deus meu.

Culpa da visão pessimista que se solta do olhar
Nos teus olhos cor de mel a tormenta
Diz-me. Qual a minha culpa na tua história
Se num antes se perde a memória

Contigo perdi tudo
O que me resta afinal
Amor absoluto
Em liberdade condicional

E a culpa de quem é, minha, talvez tua
Pobre idiota, se julga comandar
Ventania na campina

Ou então o despertar.


Amor...

O vocábulo amor anda de boca em boca
Num tempo em que a maldade impera,
A ganancia, inveja, e maledicência tosca
Meu Deus, em palavra vã, o amor degenera

Ridiculamente irrisório, atulha em troca
De holofote luzente na fartura,
Ou na mingua, assoberbante engenhoca
Num tempo sem cerejas, que seja sincera

A palavra amor, traga na lapela a esperança
Consiga fazer da vida bonança.
No olhar afeição, no canto da boca melodia


Então talvez o poeta arranque da alma
Os sentimentos que extorquiu da lama
E os resguarde p`ra sempre da ventania 


terça-feira, 27 de maio de 2014

Ainda...


Ainda o verbo amar
Tresloucado no dar
Pedaços de mim.

Rolam ladeira acima
Em fiapos de luxuria
Às vezes são penúria
E aí…
Sou pelintra.

Outras são flocos de neve
Nos teus olhos.
Braseiro no meu aconchego
São até vê bem, brisa breve
Que apazigua o espírito
Das almas vadias.

Que tal como eu, sonham…
Com palavras bonitas,
Prendas atadas com fitas,
As que nunca me deste.

Ainda o verbo amar
Maneira triste de errar
Ou talvez não.


Depende da imaginação.


Esgotei o amor...

Esgotei o amor em formas diversas
Remendei com linhas de todas as cores
E fiz almofadas de penas,
Onde descanso saudades.
Até de quando era pequena.

Pequena no verbo amar
Cresci, não sei… comigo o vazio
Repleto de mistério.
Tropeço na lama de palavras vazias
Faço delas rimas
Por vezes idiotas.

Esgotei o amor
No teu coração de pedra
No meu de catraia travessa.
E o verbo…
Ressoa liberto sempre que lhe apeteça.

Esta capacidade medonha
De brincar com palavras,
Por vezes é peçonha,
Outras é ronha,
Quase sempre é barcaça.


Que navega num mar de sonhos.


Contigo...

Contigo esgotei o verbo amar
A capacidade de argumentar
Dissolvi em todos os pretextos
Até a fúria no julgar.

Contigo reaprendi em cada vazio
Comigo trancada por dias a fio
Que nada importa, ou consome
O dom de amar

Reaprendi nos teus olhos
Que cartas fechadas, são molhos
De violetas em flor.
Agora que cruzastes os braços
Penso comigo.

Para quê tantos estilhaços
Quando os teus olhos gritam amor!


segunda-feira, 26 de maio de 2014

E agora...

 E agora?
Pergunto ao vento que sacode a vidraça.
E agora? que rolam no chão todas as folhas mortas
De uma árvore tombada.

Questiono seja o que for
Numa esperança fugidia
Quero saber qual a cor
Que deixa a alma fria.

Às vezes penso que é branco o desamparo
Outras é negro… e um reparo logo vem
Como quem não quer a coisa, malvado
Ri de mim, ri de ti, até do além.

E agora?
Que choram as pedras que os teus pés pisaram.
Será que por entre elas nascem beldroegas
Se assim acontecer é porque entregas
Nas mãos de Deus águas que brotaram

Dos meus olhos.






domingo, 25 de maio de 2014

Recomeço...

 Transporto nas mãos abertas uma ânsia fria
Nas pontas dos dedos vazio pardacento
Na boca o travo do beijo em fantasia
Nos olhos vaticínio, breve nascimento.

Assim dou por mim deambulando ousadia
Quimera auspiciosa sempre em movimento
Não importa se anoiteceu ou raiou alegria
Os fantasmas são tantos, ignoro o cinzento,

Que pesa na saudade, de tudo e de nada
Quero lá saber … é carta fechada
Quero lá saber… olho e desconheço.

A frieza do espelho, impávida feição
Que me diz incrédula em contra-mão
Porque te móis tanto? Olha o recomeço…






sábado, 24 de maio de 2014

Sina...


Sei-te no pensamento
Numa folha de árvore que cai
Até na força do vento
A tua presença não esvai.

Sei-te na pálida lua
 Por entre a chuva
Que molha amiúde os meus olhos
Por entre as ruas desertas
As buzinas dos carros
Até nas pedras cinzentas
Ouço os gritos…

De um amor muito nosso
Que o tempo não trai
Sei-te em qualquer momento
Vê tu… estranheza de vida
Remendos que o dia despeita
E a noite por vezes desfeita

Segreda. Mas que sina a tua!


segunda-feira, 19 de maio de 2014

Tudo passa

Num ponto ao sul intento o teu rosto
Desenhado no barro a tinta-da-china
Mas a sorte trocada… e no mês de agosto
O barro vermelho morre de míngua

Nesta saudade sem cor e sem gosto
Dou por mim a indagar o céu que me olha
Parece dizer que o ponto é o oposto
Ao meu querer que agora desfolha

Um rosário sem fim… mas que recordação
Que me atira por terra… é só encontrão
Se dissipa num ai sem prever o clamor

Que se solta do peito corre campo fora
Retorna no eco que ao meu ser aflora
Tudo passa apressado… mas porquê o amor!



quarta-feira, 14 de maio de 2014

Se morrer logo mais...

 Se morrer logo mais que seja em campo aberto
Como amparo um tronco de sobreiro
Que me aqueça o calor da terra, e o vento suão
Leve a minha alma e a espalhe num campo de trigo

Porque na vida fui joio, tenho nas mãos a enxada
Que dilacerou a minha silhueta, fez dela gato-sapato
Por vezes deixou-me estendida numa valeta
Tendo por companhia arame farpado

Se morrer logo mais, quero os calos das mãos
A velarem por mim, e de mortalha papoilas
Quero que me chore um velho irmão
Que tal como eu fez da terra o pão.



terça-feira, 13 de maio de 2014

Oração...

Minha Nossa Senhora
Meu Rosário de luz
Traz amor e ventura
A quem te procura
Traz um pouco de paz
De sorte também
Amolece os corações
Os olhares sem destino
Transporta no peito
Qualquer menino
A todas as mães
Dá-lhe uma força sábia
E a todos os pais
Um coração grandioso

Te rogo Senhora
Por todos nós 
A treze de Maio
Que um dia vieste
Trazer a paz

No branco da veste.

Adeus…   Quadras soltas.

De todos os amores que sonhei
Tu foste o mais completo
Foste também, eu sei
O mais vil e gaiato.

Se pensas que mágoa tenho
Reduto de dor sem fim
Enganas-te, agradeço o lenho
Que desviaste por mim.

Serei doida o suficiente
Para amar perdidamente
Para deixar partir e rir
De ti tão pouco exigente.

Às vezes escrevo assim
Rima solta na gandaia
Sempre que dou por mim
Numa hora de alegria.

Então o dia tem mais graça
O sol aquece em dobro
Rio por mais que faça
Mesmo que não tenha ombro.

Os poetas, ser esquisito
Que ao mundo levam rima
Mesmo em verso fraquito
Elevam a auto-estima.

E eu pequena e fútil
Às vezes de mau humor
Outras com certo rancor
Escrevo tanto de inútil…

Escrevo para ti e tu sabes
Sempre que o faço a preceito
As minhas palavras são traves
Que te embatem no peito.

É essa a minha vitória
Sobre a ida, fraca esmola
Sobra-me sempre a glória
De um coelho na cartola.

E para tua arrelia
Que te vês assim retratado
Para que quiseste folia
Comigo, um ser retardado…

Que enlouquece na escrita
Sou solta de alma vadia
Olha, resta a marmita
Cheia de nadas… azia.

Começo a ficar cansada
Vou parar e ir embora
Vou meter o pé na estrada
Porque o dia não demora.

Nem tampouco aquece o sol
A quem se perde na estada
Vou-me embrenhar no rol
Desta vida destravada.

E um conselho te dou
A ti que me olhas louca
Desta vida só levou
Quem se satisfaz com pouca.

Sorte. Mas que é isso afinal
A sorte fazemos nós
Nem só o vendaval
No moinho roda as Mós.

Podia ficar aqui
Até à eternidade
A rimar sobre o que vi
Nos teus olhos, que vaidade.

Esta para meu castigo
Tudo faço sem cansaço
Ai, reboliço mais esquisito
Esta escrita, desembaraço.

Tem a língua afiada
Diz sandice, ou talvez não
Hoje estou inspirada
Nas rimas ao trambolhão.

Precisava ter eu sei
Quem comigo ao despique
Aí, ias ver a grei
Rebolando em trambique

Vou-me mesmo, tem que ser
O Pulga gane aflito
Porque isto de cão ser
Também merece um passeiozito

Adeus, até ao meu regresso
Comecei a falar de dor
De amores e certo reverso
Termino a prosa com cor.








domingo, 11 de maio de 2014

Sem alarde...

Se viesse o meu amor por entre a tarde
E trouxesse nas mãos um sonho antigo
Eu juro, ficaria quieta, sem alarde
Não saísse o encanto pelo postigo

É que o tempo das cerejas é covarde
Ao meu peito trás a sombra em castigo
Assim que o coração se aventura e arde
Num terreiro em que busca um abrigo

Mas quem sabe troque as voltas em viés
Às trevas que circundam de antemão
E trespasse esta sina de lés a lés

E o tempo das cerejas então zele
Em cofre rubro o meu gasto coração.
Para que então nas cerejas o meu mel…


Pigmeu...

Porque me chama a ilusão que arde
Em fogueira de aflição, porquê eu…
Que transporto no peito fútil trave
Que consome em sinistro apogeu.

As lembranças ressequidas em alarde.
Às vezes vislumbro um alegre pigmeu!
Quase sempre ao final da tarde
Caricato… olho e ele desapareceu,

E então no meio do nada é que descobre
Que a quimera vive paredes meias
Corre veloz nem o vendaval encobre.

Esta força que a planície trás átona
Espalhadas pelos campos alegrias.
Pigmeu, não passas de mente brincalhona!




quarta-feira, 7 de maio de 2014

Posse...

A ostentação ridícula da posse
Deturpa a realidade, é fria e leviana
Produto de insuficiência insana
Falha a certeza, pelo correr da água
No rio.

Desagua sempre no mar, tal amor
Produto da alma, vadia e incontrolável
De que serve um sopro inerte, impenetrável
De que serve, se a mente galga fronteiras
Sem pudor.

A ostentação ridícula da posse
Retira a paz, o brio, até o que não se tem
Tudo o que o homem precisa
É de fechar os olhos

E acontece o sonho.


Na hora de debandar...

De que servem palavras bonitas
Visitas a qualquer hora
Se às vezes são meras fitas
Na hora de ir embora.

Penso comigo afinal
Se um pai cuidou e amou
Porque o seu tempo acabou
Numa cama de hospital

Ou num qualquer abrigo
Que o dinheiro pode pagar
Quem se preocupou consigo
Na hora de debandar

Em busca da ligeireza
Da vida fácil que impera
Viveu um pai a grandeza
Para ser esquecido, quem era!!!

Quanto ditoso é
O que cuida dos seus
Assim se mede quem é
Nas dores que então venceu.


terça-feira, 6 de maio de 2014

Porque perco tempo...

Porque passa o vento sem olhar p`ra trás
E me deixa estendida no chão
Porque passa o sol que agora faz
Para logo mais se afastar o verão

Porque passo eu, mesmo sem passar
E a vida corre eterno lamentar
Porque passa o dia se a noite se achega
Nas rugas do rosto que renega entrega

Porque passas tu meu amor vindouro
Se logo mais não sabes quem sou
Porque passa o sonho efémero tesouro
Se amanhã sou o que restou

Porque passa tudo que fica afinal
Na linha da vida uma mão fechada
Porque perco tempo com o que está mal
Se o tempo matreiro corre em debandada.


De tudo o que tenho...

Descobri que em tudo o que tenho
Tudo me falta afinal
Resta um simples lenho
Que me colhe no pantanal.

Não espero palavras de amor que não ouço
Penso numa palavra amiga ao caminhar na rua
Um sorriso no rosto, um bom dia apresado
O calor do sol, esse é meu aliado.
Não espero gestos altivos
Na ganancia ocorre a míngua
Preciso de cantigas ligeiras
Para pesada me basto
De empurrão na ladeira
Ou ombro p`ra chorar a mágoa.

De ter nascido descrente
E desdita também
Ter na ponta dos dedos semente
Que às vezes bem pouco convém.

Descobri que em tudo o que tenho
Afinal bem pouco me basto
E no amontoado lenho

Vê bem até nasce pasto…


Deixem correr o poema...

O poema pode ser doce
brilhante, insidioso ou asqueroso.
Deve ser arrogante.

De uma presunção maliciosa 
ferir o olhar
alterar o coração
apaziguar e odiar.
Deve ser interrogação.

O poema deve ser fronteira
que se escancara par a par
nunca por nunca ser, barreira.
Entrave ao despertar.

O poema
um rio inquieto
a trespassar o mundo
nas mãos a paz,
sorte, mentira ou verdade.
Uma mulher nua
um homem em êxtase
uma criança que corre.
Um cão, vadio e amigo.

O poema é sangue nas veias
o voo de condor
é mente que esperneia
com amor ou com rancor. 

De que servem letras belas
se o recheio for oco
soltem versos nas vielas,
deixem correr as rimas.
Por entre ratos, vadios
e prostitutas, por entre
Igrejas e santos.
E mentes loucas.
Por entre gente comum.

Deixem correr o poema
é de todos e nenhum
silaba a silaba, fonema
escavado num trinta e um.


O resto, o resto até faz pena.


O vento a chamar...

Não sei de ti há tanto
Da sorte nada sei também
Nem desdém e no entanto
Sei que sou ninguém

Sei do campo a perder de vista
Das flores num manto belo
Até das cegonhas no alto
Eu sei, mas nada sei de ti
E no entanto sei que vi

Além no céu azul
Uma nuvem passou ligeira
Trouxe a até mim
O queixume
Vê bem. Rama de oliveira
Onde poisa o Melro
E até o Gaio
Onde poisa a sorte
Num botão em flor
Onde poisa o olhar
Quando quer chorar
Nada sei de ti
O vento a chamar.



segunda-feira, 5 de maio de 2014

Sombra...


Porque se foi o nada, se nada era
Ao meu lado deixou a sombra
Essência deslavada
Pelo fantasma dos sonhos

Olho as andorinhas que dançam,
Dançam e chilreiam
E nada me ocorre

Certamente que morri
Uma parte de mim, morreu
Camafeu infernizado, o eu
Que me tolhe na cegueira
Do que foi

Estranha apatia a desta hora
Palavras cruas e ocas
Resgatam as lembranças
Que não quero
Os sorrisos que não tive
Num tempo que não foi

Respiro aliviada
E as andorinhas respiram comigo
Afinal esta hora assombrada
Não passou disso mesmo
Uma sombra desvairada
Que me entrou pelo postigo.




domingo, 4 de maio de 2014

Acto de parir


Devia dizer
O que os olhos querem ver
Meto a mão ao coração
Que aflição
Despi-me de palavras belas
Que fiz delas

Se o dia fosse terno
Mas em volta desespero
Mulheres de olhos no chão
Ao trambolhão
Penso comigo porquê
Porquê…

Até o acto de parir
Distinto no destino
Grosso modo o sorrir
Se perde o cretino.




Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo