quarta-feira, 30 de abril de 2014

Saberás...


Saberás tu porque rio com vontade de chorar
Porque finjo para o mundo tudo menos amar
Saberás tu das minhas dores, da força ao ficar
Enquanto tu foges em cobarde debandar

Saberás tu afinal que o sol aquece a alma
Sempre que o choro se nega num sorriso colossal
Saberás tu tristemente que não sorris e afinal
Passas pela vida pobre e indigente, e agora

Que ficas por aí a remoer frustração
Enquanto, eu rio com determinação
E saberei enfim que dos fracos nada conta

O que sobra a granel é coisa de pouca monta. 


Gosto...


Gosto de poemas corridos
Cheios de musicalidade
Mesmo na vida vencidos
Por inútil vaidade

Gosto de palavra cheia
De entendimento popular
Nada como sangue na veia
Na arte de versejar

Gosto de uma mensagem amena
Mesmo nas entrelinhas
Nada como o fonema
Para afastar as grainhas

Que por vezes caem a custo
No pobre papel timbrado
Por recalcos e frouxo uso
Gosto de versos em brado.

Gosto de tudo afinal
O que os olhos lêem com gosto
Não gosto de sentir trivial
Em linhas esperneando o oposto.




Junho...


Começa agora o tórrido deambular
Por entre areias e nesga de mar, soluça
Um ano inteiro que no atrás esmiúça
Corre que corre, atreve-te agora a saltar

Para as ondas que imploram ao chamar
Por ti, sonhos perdidos, agonia tosca
Dos que partiram, numa voz rouca
Gritaram como sabiam ao deixar

Caminho liberto para alto mar, então
Porque esperam os olhos, infértil razão
Que se distrai perdidamente no não

Não, deixa para trás é só confusão
Joga-te à água, chegou agora o teu verão
Junho aí está, seduz em lima limão 


Maio...


Se ao caminhar por estrada incerta
Sob os ombros não pendesse estranha cruz
Se das estrelas não descesse tosca luz
Meu amor que bom seria a Primavera

Por caminhos tortuosos surge a dúvida
Dialecto auspicioso, qual o povo que traduz
Se enfia a mente tristemente num capuz
Busca tróia, colorida uma quimera.

Ditoso chão que é plantado à beira mar
Sob as ondas e do barro que é vermelho
Onde gente simples, infeliz no caminhar

Não se afoita a aprender num questionar
Tudo, o mofo que de caduco é tão velho.
Na Primavera o mês de Maio quer voltar.



terça-feira, 29 de abril de 2014

Que mais...


Tenho dias, tenho horas
Em que o instinto me apela
Vai porque demoras
Tanto tempo na janela
Da inquietação

Tenho dias, tenho noites
Que falo comigo mesma
Respondo a cada questão
Coloco no coração
 Anseios ou aflição
De seguida ato as pontas  
E falo por entre dentes
Deixa é abolição
Da imaginação.

Contradição
Quando a saudade aperta
O papel coitado parece irado
Além de maltratado sente o desapego
Da minha ladainha ou então da descoberta

De que o poeta diz e desdiz
Igual a petiz, ou então aprendiz
Na arte de dizer, ser ou não ser
O ter e o querer, ainda está por ver
Que mais há a escrever.



Receio...


Saudade do vento por entre os meus cabelos
Nas pontas dos dedos trouxe um dia anelos
Saudade de tudo, até dos nadas
Restaram apenas flechas guardadas

No fundo da alma onde o sonho pernoita
Aninhado em receio, mas quando se afoita
A viver, vivendo correndo tentado vencer
O alheio vazio, receio ao prever

Que o vento de outrora se perca na berra
Tantas as certezas de como se erra
Ao lançar ao vento os nossos anseios
Que solta balofo, leva nos arreios

O que de melhor colheu sem olhar a quem
Pobre do vento de todos é ninguém…




quinta-feira, 24 de abril de 2014

Liberdade...


Por entre os dedos os cravos secos
Nas mãos de calos doridas
Escorrem revoltas, sonhos encobertos
Que até os corvos se riem das feridas

Ai meu país, meu chão, meu sal
Que fizeste do sonho que se ergueu um dia
Reino sem trono a boca vazia
Estômago seco no seco da boca
Ai meu país tudo está mal
E o sonho que conta?

Lá longe onde a memória não trai
Levantaram-se jovens, num dia de Abril
Levaram ao povo os cravos vermelhos
Ergueram-se as mãos e os olhos dos velhos

Liberdade, liberdade!

E hoje onde está o vermelho rubro
A esperança e a igualdade
Onde está o sonho, e aquela criança
Que chora de fome, onde está Abril…

Onde está Liberdade.




terça-feira, 22 de abril de 2014

Estranha paixão

Tenho longas conversas com o silêncio
A solidão senta-se à mesa também
Questiono os dois e mais me convenço
Sou ave liberta que não é de ninguém

Nestas conversas o monólogo impera
Ambos anuem e me dizem que sim
Serei eu que a sorte governa
Ou serás tu que assim te convém

Maldita palavra faca que corta
Que se crava no peito com tal precisão
Derruba a sombra que me bate à porta
E trás ao papel a estranha paixão

Que nutro nas horas sem sinal de vida
Nada acontece no leito vazio
Apenas a luta renhida

Comigo mesma por dias a fio. 


quinta-feira, 17 de abril de 2014

Sentir...

Nas horas em que a saudade aperta
Digo o teu nome baixinho
Questiono a vida e as curvas do caminho
Olho o céu azul, lá no alto o teu rosto
Estico a mão, quero sentir
Os teus lábios a sorrir
A distância é enorme, e o infinito desdenha
Na minha mão o vazio
Coloco olhos ao chão, a mão rente ao corpo
Caminho mesmo cansada
E o vento me traz num sopro
O eco da tua voz, chama por mim em surdina
Assim dou por mim a sorrir
Pois quem não sabe sentir

Na vida vegeta e lastima.


quarta-feira, 16 de abril de 2014

Diga-me

 Diga-me lá você que me lê
Em tantos dias, em tantas horas
De alegria ou solidão
Vem até mim e lê

O que me sai em delírio
O que atiro em declínio
Ou então elevo ao alto
Com espalhafato
Diga-me lá, preciso saber
Tenho a mente desarrumada
Ao escrever
Ou é retórica de alma penada.

Que deixa que a vida lhe fuja apressada.



Palavra...

A palavra é uma arma
Disseram um dia
Entra desvairada
Pela mente vazia

De todas as palavras que atiro
Ao teu cérebro fechado
Deixo nelas o gosto
Do teu pecado (imaculado)

Na minha leviandade
Vivo a tua cegueira
A tua falta de coragem
Em pular a ribanceira

Tal meretriz
Sonho, serei feliz
Claro, trago ao papel
A tua pele

E agora alguém me diz
Qual o preço a pagar
Pelo o diz ou não diz

De versos saber moldar.


Tambor...

O amor que transporto
É muito meu
Nem sequer lamento
Que não seja o teu

Essa falsa certeza
De que o poeta
É infeliz
Veio na correnteza
De olhar petiz

Florbela que foi musa
Infeliz no seu viver
Claro, foi intrusa
No modo de pensar

Outras como ela
Que vieram a seguir
Abriram a janela
Para eu intervir

Hoje sou feliz
Tal como eu muitas mais
Mulheres que o mundo diz
Enquanto tu vens espreitar

Pela calada, corroída
Num lamaçal de vaidade
Olha vai moer o juízo
A quem não te fala verdade.

Porque escrever de raiva ou amor
Nos tempos que vão correndo
É banal, virou tambor

Enquanto vais remoendo…


Poeta de estrada...

Em tudo o que digo, intento
Desmembro, atiro areia para os olhos
Em altos gemidos
Outras, arrepio caminho

Foi Deus que me deu o condão
De escrever
Cabe a ti a interpretação
Ao ler

Coitados dos burros
Se fossem só ``burros``
Felizes dos espertos
Se não fossem incertos
Bem-aventurados os loucos
Dormem tranquilos
Malfadados os coitadinhos
Tem falta de coragem

Como vês escrevo
Com uma leviandade muito minha
Com vaidade e arrogância
Com carinho e muita dor
De merda, até de flor
Escrevo de olhos fechados

O que desconheces é que falo de ti
Ao escrever de mim
Que falo do medo
Que eu não tenho
Falo de pobres e dos ricos

Aos pobres levo esperança
Aos pindéricos dou a facada
Ou não fosse eu poeta de estrada

Aquela, que corta este país
Onde homens e mulheres
Escrevem o que te desdiz.

E no amanhã, outro que não tu interpreta
Enquanto tu passaste… tão SÓ…




Abril...

Ao abrir os olhos pela manhã
A imagem desce tranquila
Do teto que é branco.
Traz nos olhos saudade
Nas mãos fraternidade
No coração uma bola de fogo

A primeira questão
Que fizemos nós com o quinhão
Que descaiu no colo
Que fiz, ou tu
Com a liberdade

Abri os olhos quarenta passaram
Tantos os molhos de cravos, mingaram…
As mãos agora vazias
Nos olhos, revolta
O coração mais frio que nunca

Ai, como queria que aqueles dias
Voltassem
Num Abril de esperança
Esmiuçassem


A vontade de fazer diferente.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Às vezes...

Às vezes oiço, outras nem tanto
Também falo só por falar
Ou então fico calada, logo
Escrevo, de uma assentada
Sou mal-interpretada
Sou aplaudida, faço disto sururu
Escrevo, para martírio…
Meu.

Se o olhar fosse emergente
Que alegres os meus dias
Escrevo o que vejo, negligente
Seria.

Se a palavra fosse vã
Respirava a céu aberto
Mas era ovelha sem lã
Morreria de frio.

Tudo isto para dizer
O que o poeta um dia disse
Chorar mesmo sorrindo
Fingir ser, e não ser
Fazer do poema um rio

Onde possas lavar as mágoas
Ou seja a tua almofada
Mesmo que sejam adagas
Verdade ou mentira

O poeta é indigente
Outras vezes reticente
É rei e pedinte
Dissimula e empurra

Tudo isto sou eu…




sábado, 12 de abril de 2014

Ilusão


Avanços, recuos. Não vês que são gritos
Na garganta retraio, já não sei
Se fujo de mim, se de ti me afasto
Se é esta vida, cinzento nefasto
Nem quando surge o sol, eu sei

Se o progresso ofertado é real
Ou se é somente vasto areal
Onde a maré vazia ilude o futuro
Sabes, por vezes um figo maduro
Conforma o olhar e nós

Tão secos por dentro tremendo de frio
Renegamos tudo, assim foge o Estio
Tolos, se a vida é só uma de que vale fingir
Que ao saltarmos tudo pode ruir

Avanços, recuos…Uma linha incerta
Nos olhos fechados instantes vincados

Por medo idiota.


sexta-feira, 4 de abril de 2014

Monte...

Cresci numa casa branquinha.
De telha vã, o telhado.
Uma chaminé amarela
caiada a oca.
De terra batida, o chão!

Recordação
de quando criança.
Do vento suão
resta a lembrança.

Uma figueira na rua.
A casota do cão de guarda.
A capoeira onde a perua;
aguarda!...

Casa de pobre, feliz.
Quem me desdiz.
No descampado perdido
o velho monte ferido
implora à vida.

Volta!...
Criança traquina
tráz no peito a vontade
e quem sabe...
Mantenha de pé...

A velha figueira sem figos.
A capoeira sem rede.
A chaminé sem lume.
E afaste os gemidos.

Que a saudade de outrora
crava no barro vermelho.
Serenamente; implora:
Salvem o monte velho.

Cresci num monte caiado...
P`las mãos que ceifavam o trigo.
De pé azul rente ao chão.
Um forno onde cozia o pão.

Hoje; ao recordar o brado
Qque chega no vento em gemido...
Tal como meu monte caído
sufoco na recordação.




quinta-feira, 3 de abril de 2014

Sete pecados capitais


Inveja…

O despeito em gritos surdos.
A alma humana enegrecida.
Falta de horizontes, afligida
pela pequenez dos costumes.
Em gritos!...
O provincianismo cínico
a vaidade
por aquilo que aparenta.
A simplicidade tingida
dos ecos,
que borbulham tal vertoeja
na mente que esperneia

Num retrato completo:
a Inveja.



Vaidade…

Simbiose perfeita
Entre o sim e o não
o ser e o ter
conjugação.
É apelo
repelente, suplemento
da mente.
Sempre mais e mais...
Alarido repetitivo
do eu.

Numa palavra:
Vaidade.


Gula…

Mais e mais
Assombroso sobressalto
nos olhos, papalvo.
O estomago
grita que grita
insaciado, satânico.
Leva à loucura
alarido festivo
uma dor de barriga.
Afinal!...
Emergente.

Em estranha visão
a Gula.


Preguiça…

Aiiiiiiiiii...
Vai que eu não vou.
Reconfortante imagem.
Pura sacanagem.
do corpo.
Tudo me mói.
Estranheza em flor:
que Tarda.
Preso na mente,
desconhece comando.
acaba mingando,
sem força.

Traduzido em miúdos:
Preguiça.


Ira…

O vento que ronca.
P`lo peito que adentra.
Contenda!...
Músculo abrupto
na ponta do braço.
O cérebro
comanda ligeiro.
Sem reconhecer
um ar que lhe dá...
Cerra; afligindo:
Ódio

Tudo isto é
Ira.


Luxúria…

Mel que lambuza.
menina do olho
o cérebro esperneia.
em fétida teia.
Mácula.
Virtude ao contrário
intenta o ser
o ter e o querer.
Na ponta dos dedos
esponja!...
Ensopada no cérebro
em chama.

É assim:
Luxúria.


Soberba…

Ai credo!...
Assim não,
ou mais adiante.
Suspensão
arrogante do ego.
Estima que é
aos pés...
Maior, ou menor
rebento infernal
intemporal
Ao homem (ser)

Está bom de se ver:
Orgulho.


terça-feira, 1 de abril de 2014

Remoinhos.

Ao sentir o vento
O sopro no meus cabelos
Remoinhos, era vê-los
Em dias de primavera

Ai de mim, um dia fui esteva
Perdida no Alentejo
Encruzilha adormecida
Sem ambição que denote
O sopro do vento norte
Fui ave de asa ferida
Até um riacho faminto
Juro, às vezes sinto
Ao recordar a aragem
Uma falta de coragem
Inunda o sentido
Deve ser a saudade
Ou então uma quimera
Remoinhos, era vê-los

Em dias de primavera.

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo