segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Grito...


 Grito e o grito
Perde plenitude
Desaba amiúde
Na tua inquietação

Grito, talvez assim aconteça o necessário
És tu quem me espera no fim da estação
Quem desassossega a minha frustração
És tu que presentes o meu desnude
Me olhas e finges um palco encenado
Onde o actor ensaia um fado
Fardo, serei eu um caso parado

Grito numa voz estafada o meu azedume
Finjo tão bem que lhe encontro perfume
Nas horas tardias rebeldes vadias
Grito apressada até ficar rouca
És sempre tu que me chama louca

Grito e o grito emudece
Incerteza ténue
Em voz serena por fim te achegas
O grito finda, morreu de ciúme.

domingo, 26 de agosto de 2012

Primeiras chuvas



Nas gotas das primeiras chuvas lavo a essência
Refresco então a minha emoção seca pelo calor do verão
Que dizer à leveza da chuva, senão que é bela
Apesar da mancha amarela que deixa na minha janela
Que dizer ao vento manso que desloca o manto denso
Nuvens negras, viajantes nos céus temidos na terra
De que têm medo os homens, nuvens são nuvens
Pedaços de algodão imagino assim, será contradição
À sua passagem a lama levanta-se do chão

Ao longe onde habitam os meus sonhos há uma lagoa azul
Tenho medo meus deus que se despeça do sul
Rume para terras distantes onde o homem não tenha lugar
Quem sabe o amarelo na chuva acabe por definhar
E as altas chaminés, os escapes dos carros, lixo nas marés
A lama que hoje se levanta à passagem da chuva
Soterre para sempre a inercia e chuva seja só chuva.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Para sempre



A esperança se envolve num manto de segurança
Aprendo com ela a atrair bonança
Nos dias intranquilos em que viro onça
Ai, tamanha pertinência a minha, rainha
De coisa pouca mas fico rouca ao gritar
Parem… recuso-me a olhar a minha condição
Afinal tenho o mundo na minha mão.
Doidice vencida de repelão
Nada com nada tão grande aflição

A que me leva a gritar
Porquê?
Porque me julgo sem julgar
Me olho sem olhar
Penso e repenso sem me escutar
Meu pobre coração aguenta
Os olhos cansados ainda vislumbram a minha imagem
Tosca no fundo da bacia onde a água fria segreda

Deixa de que vale perder tempo
O tempo é cúmplice num contratempo
Em que a terra chama e a voz se cala
Para sempre no vento.

Aos meus pés


Aos meus pés descai um rio insidioso
Nos socalcos das margens o percalço
De um momento sem nome.
Todos os momentos carecem de nome

A dor de cabeça o momento actual
Nas costas o ontem infernal
Olhar nublado quase sempre é passado
Diferente um futuro almejado

A meus pés um país periférico
Retalhado de verde e vermelho
O verde da serra frescura sadia
Rubro da cidade numa ventania

Um rio insidioso é o que vejo
Sempre que presto atenção
Aos passos que passam, um desejo
No olhar e no coração

Gente faminta de crença passa e não pára
A criança que chora, o homem de samarra
Uma viúva com filhos pequenos tem fome
O rapaz desengonçado que esqueceu o nome
Como me dói aquele velho acolá
Um outro ao deus dará.
Como dói uma terra sem prumo
Como eu queria ofertar-lhe o rumo

Num poema escrito ao contrário
Igual a bebé no berçário
Costas para cima, a cara de lado.
Almejo roubar-te povo esse teu fado.

sábado, 4 de agosto de 2012

Espelho



Ao sol tórrido de Agosto um cão vadio se abeira
Ignoro enfastiada o seu andar pesado
O abanar de cauda num gesto faminto implorando
O quê? Atenção, comida, quem sabe tem sede
Cão vadio, não passa disso cogito enfastiada.

Dou dois passos em frente mas logo recuo
Afinal o cão é simpático, tem olhar doce
Estico a mão com a incerteza aflorando
Morde ou não morde questão pertinente
À minha mente dolente extenuada

Pelo sol de Agosto, os raios incidem no cão
De um castanho mel com o mel no jeito de olhar
Penso e no meu pensar se reflecte o reflexo
De uma alma com fome triste penar
Afinal já o vejo simpático dá que pensar

A primeira impressão pode ser teatro
Quase sempre encenado pelas evidências
Num cão vadio o espelho reflectido
De uma lida vasta de pertinências.





quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Rumos


Rumos, a orientação sentida
Ontem ruíram na avidez
Da palha que arde, um fogo lento
Percurso insidioso na pequenez
Que à nascença vestimos de oferenda
Intercalando um breve momento

Em que nos sentimos grandes

Rumos hoje se ergueram
Castelos de sonhos
Musicalidade em ostentação
Espigas férteis em grandes molhos
Fontes calmas que água verteram
Assim acalmando o coração

Por instantes tão pequenino

Rumos serão traçado
Por nossa mão desnuda
Outras são presente dado
Que se achega na sina que muda..

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo