quarta-feira, 25 de maio de 2011

Eu sei Alentejo



Porque ficas aí
Soltando da alma
Pedaços de ti
Como se fossem meus

Porque ficas aí
Sem corpo, sem rosto
Aos olhos meus
Pressinto o calor
Que te sai da alma
Assim como o frio
Que te aperta por dentro
Eu sei Alentejo
Que te corre no sangue
Eu sei mas não vejo
Sei que consome
Pedaços de mim
As rugas de ti
Pedras na ladeira
Que levas às costas

Porque ficas aí
Porque me provocas
Numa escrita subtil
É a mim que invocas.

Desdém



Não
Imagino
O deserto
De quem
Nada tem

O ar
Condicionado
Ralha-me
Com desdém
Zzzzzzzzzzzzz
Repetitivo
Barulho
Ensurdecedor
Quero silêncio
No meu regalo
De quem tem
Ar condicionado

Zzzzzzzzzzzz
Mosquito
Esfaimado
No estômago
De quem tem
Que lutar
Pelo fresco.

O ar condicionado
Refresca-me com desdém!
Enquanto no mundo morre outro alguém. 

Moinhos de vento

Doem as palavras que não sei dizer
Os olhares que não tenho
Dói-me tudo deus meu
Até me doem os deuses que invento
Sou um poço de dores em apogeu

Caminho curvada sem corcunda
Gosto de mostrar a cara fechada
A mente trancada à ideia fecunda
Caminha desfeita e mal amada

Assim desfaço um rosário sem fim
Com contas de giz desfeitas por mim
Assim caminho com penas a jeito
Onde me engalano para meu proveito

Tantos os ornamentos de que a mente se enfeita
Esquecendo que é tão fácil e até enjeita
Olhar a vida sem pena de nós
Afinal somos os moinhos e os donos das Mós.

Talvez

Eu
Sou
Poeta
Carente
Sonhador
Despistado
Mal amado
Ou então
Adorado
Odiado
Sem
Pontos
De reticência
Pertinência
No olhar
Um ego
Do tamanho
Da barriga
Tanta vez
Com azia
Faço razia

Sou tudo isso
Mas imploro
Ou não
Um olhar
Do meu país
Que vive
Feliz
Na ignorância
Das vozes que tem

Talvez
Daqui por
Cinco séculos
Em convénios
A minha terra
Reconheça
E se abasteça
Dos poetas desta era.


Seria

Bom dia
Por vezes
As palavras
São ocas
Saídas
Da tua boca
Bom dia
Seria
Se o dissesses
Com alegria.

Acaso

O peso da pedra é leve
Sempre que derruba ribanceiras
Por acaso
O peso dos dias é obeso
Sempre que as horas surgem matreiras

Por acaso meu amor
Trôpego é o afecto
Que respira solidão
Por acaso meu amor
Trôpego é o coração
Que não parte à descoberta

O acaso do acaso
É cinza que se esvai
É pó suspenso num ai
Por acaso, mas que caso
Pesado em balanças decimais

O peso que aligeira
O pesar das decisões
Sei que a vida é matreira
Cheia de contradições

Por acaso neste caso
Nada é o que parece
O acaso desvanece
O peso que envelhece

E a pedra
Que será a pedra
No acaso deste verso
Meu amor é contrapeso
De poeta perplexo.


terça-feira, 24 de maio de 2011

Ilusão

Amei-te por entre uma nesga branqueada
pela planura da geada que me inundou a alma
assim em plena madrugada me vi atracada
ao sonho enregelado que se atreveu
a deixar-se levar por baço céu

Aos meus olhos o amor é futuro
aos teus é ocasião
aos meus será sempre vindouro
para ti é uma cesta de ilusão

Atrevi-me a abraçar a contenda
saí dela em pedaços, enregelados
pela frieza esfarelada sem emenda
que afasta os nossos lábios fechados

Amei-te por entre tropeções
tu amaste-me por entre levitações
em espasmo dilacerado, comovente
filme encenado para cativar
não lamento beijos ao deitar
nem abraços pela manhã
imaginei sempre bagos de romã
que um dia rolariam pelo chão
a fome não passa de ocasião
tu e eu, e eu e tu
bonecos inanimados
em cenários trocados

por um amontoado de emoções
sem certezas ou razões…

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Onde estão

Onde estão palavras de amor
Um beijo de boa noite
Sorrisos ao amanhecer
Onde está o calor
Talvez se afoite
Um outro corpo aquecer

Sobram palavras desfeitas
Promessas vadias
Preciso de um olhar cúmplice
De esperanças refeitas
As horas vazias
São fio de foice
Cortam em aflição

Onde estão palavras de amor
Aquelas que inventei
Todas as que neguei
Até as que desconheço
Por vezes tenho pavor
Não sei o que alcancei
Nem o que desejei
Preciso de um cobertor

Um sorriso no meu viver.

domingo, 22 de maio de 2011

Essência


Retirei pequenas partículas da minha essência
 Com elas pensei fazer um rosário
Contei uma a uma, mas que grande fadário
Perdi-me na conta e por contingência
Rebolaram pelo chão, se escaparam da mão

Correram felizes por entre as linhas
De uma sebenta, sebenta da vida
A mais pequena e mais atrevida
Correu para a rua e chamou as vizinhas

Vieram as estrelas e algumas nuvens
Vieram as pedras e o pó barrento
Veio o Alentejo sempre pachorrento
Veio um sobreiro e veio a alma
De um povo faminto, rogando por calma
E eu, encostada a um canto estendi-me no chão

Por ali fiquei tentando apanhar
As minhas partículas sempre infernais
Saltaram correram, brincaram sem medo
No fim adormeceram, e eu em segredo
Puxei da sebenta, escrevi um poema
Desleixei gramática e até um fonema
Aconcheguei cada uma com leve doçura
Na mais pequena atei uma fita

Pela manhã ao acordarem
Voaram em versos pela vizinhança
Levaram amor e muito carinho
Alguma saudade e um grande beijinho.
E presa na fita foi uma promessa
Escreverei cada linha da minha sebenta
Com a alma liberta e com mente travessa.



quinta-feira, 19 de maio de 2011

Atalhos

Ser impaciente, é ser alheado
Ao peso de um pesar curvado
Sob o peso de ombros pesados

Pelo peso dos anos que são alternados
Entre pesos obesos e pesos eruditos
Não serão sempre sábios os pesos da vida
Mas serão contrapeso na hora da escolha
De um passo apressado sob o peso da sorte

Uma vida pesada em balança decimal
Mostra o equilíbrio entre a sorte e o ser
Ser impaciente é a meu ver
Um modo de ser bem teatral

A impaciência é a mola redutora 
Que simplifica a vida por atalhos.

Trrimmm

Se o telefone tocasse
Me trouxesse a tua voz, imaginável
É aos meus ouvidos o som variável
Dos pensamentos, quem sabe chegasse
Em forma de trrimmm
Um beijo por fim

Nesse dia meu amor, lembraria
Que o numero nunca te dei
Quem sabe aconteça a magia
E me telefones, assim cobicei.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Colina

São dezoito e trinta
A tarde descansa no altar do poente
As espessas nuvens dão-lhe um tom diferente
Final de Maio o sol já vai alto
Eu descanso o olhar no planalto
Onde os grilos deviam cantar
Choveu, os grilos acabaram por se afogar
Assim eu me afogo ao te recordar
São dezoito e trinta
Descanso o olhar na recordação
O pensar nos dias de Verão
Meu amor são dezoito e trinta
Penso que a tarde talvez pressinta
A saudade que descansa no meu olhar
Olhando a colina que me finta de frente.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Clamor

A chuva bate na vidraça
Lava a alma deserta
Entrelaça-se no som do violino
Que grita sem dor
Uma musica de amor
A chuva bate na vidraça
Trás com ela a esperança
Que se enlaça na musica de fundo
Amanhã o dia não será surdo
Ouvirá o clamor
O vento promissor
Não anunciará trovoada
E sim a tua vinda
Com algum ardor   

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Dor

Dói
Aquele fio de cabelo branqueado
A falta de um olhar cruzado
O silencio funesto
Que corrói
Dói
A mão vazia
Na manhã fria
Prolifera a sombra, vadia
Que destrói
Doem
Os medos
Que são penedos
Por entre os dedos
Destroem
E moem

Aquele fio de cabelo branqueado
Não sei se o tombe para este lado
Se ao meio o deixe caindo em feixe

Quem sabe me queixe
Ao dia que nasceu nublado
Quem sabe o olhar me deixe
Esquecer este ar cansado.

domingo, 15 de maio de 2011

Máscara

É medonho demais
Negro demais
Como é vil a prepotência
De julgamentos funestos
Arremessos
Que jogam ao chão
Debilidades
É medonho demais
A manipulação arbitrária
De vontades

Quem és tu
Que apontas o dedo
Pesando na balança
Qualquer passo
Quem és tu
Que mente perversa é essa
Olhas o mundo
Segundo as tuas acções
Quem és tu
Pedindo explicações

Se quando te olhas no espelho
Nem te reconheces
A máscara transfigura
Até o teu olhar.

sábado, 14 de maio de 2011

Olhar

Visto-me tanta vez
Fico ali a cambalear no sentir
Visto-me tanta vez
De amargura, falso rir
Daquilo que me dói
Deste medo que corrói

Do morrer e a solidão

Mas quando menos espero
Uma pomba se agasalha
Dos meus medos faz palha
Me afasta do desespero

E mostra valer a pena

Viver assim como vivo
Dizer o que devo dizer
Olhar com algum sentido
As pedras que querem moer
Aquilo que penso entender
O dia é para ser vivido
Levando além o crer
De um sorriso atrevido
Que me diz como é bom saber.

Que as palavras transportam
Para longe a ansiedade
Num abraço apertado
Um desejo extasiado
Um gesto de amizade
Na lonjura a verdade
Está no olhar apurado
De quem olha com vontade

De um verso triste, entender.


sexta-feira, 13 de maio de 2011

Sede

Tenho sede
Sede de palavras belas
Francas janelas
Olhares abertos
Ao novo
Tenho sede
De amor sem juras
Que se sabem lonjuras
E na vida se perdem
Tenho sede
De um beijo dado
Sob a estrela da manhã
Quem sabe amanhã

Será o dia em que a fonte jorra
E a sede que tenho mate a desforra.

Inferno

É infernal
a tua voz aos meus ouvidos
por vezes não entendo os ruídos
na surdez que me imponho, abismal
o porquê de tanto sal.
Essa guerra onde os sentidos
são levados à exaustão
já não te inquiro
tudo não passa de giro
um circo encenado, retiro
para as tuas e minhas frustrações
onde inventamos paixões.
Infernal retiro de contradições.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Tristeza

Não peças para voltar atrás
Passos incertos o que são
Talvez bola de algodão
Eu sei que sou mordaz

Não peças um fechar de olhos
Muito menos negação
Não volto à aflição
Que trás fartos novelos

Nem sei se tenho pena
Lamentos para que servem
A tristeza é uma tarde
Onde despontam as nuvens
Mais vale
Chorar agora
Ir em frente, ir embora
Tristeza não é estandarte
Desfraldado a hora certa

É uma nuvem que passa
Dando asa à descoberta.


Beatriz


Um laço, uma fita
Um vestido de seda
Uma coroa azulada
Uma menina vaidosa
Rabina e caprichosa
Olhando o espelho, acredita

Que é princesa encantada
De um reino distante
Seu mundo é hilariante
Cheio de fantasia
Mil cores e magia
Sapatos de salto alto
Brincos de azul-cobalto
Uma música de fundo
Sabe que é dona do mundo

Onde os sonhos são mágicos

São horas de dormir
Diz-lhe a mãe a sorrir
Espera…
Falta, beijar a fera
Dá um beijo repenicado
Ao júnior apalermado
De gato passou a fera
Felino, sempre quimera
Aos olhos da Beatriz

Aconchego, sono feliz
Adeus pequena princesa
Aos meus olhos fortaleza
Dos teus sonhos sou aprendiz.

O poema original que teve que ser revisto ao participar na Antologia Por um sorriso

Beatriz


Beatriz... um dos meus cinco poemas que integram a Antologia Por um sorriso, cujo direitos autorais revertem a favor da Ajuda de Berço, saliento também que a emissão desta obra foi suportada pelos autores numa parceria com a editora. Dou assim inicio à apresentação dos autores, ao longo dos dias irei publicando um poema por autor, Não... esqueça já está nas livrarias contamos consigo.


Um vestido de seda
Uma coroa azulada
Uma menina vaidosa
Rabina e caprichosa
Olhando o espelho, acredita
Que é princesa encantada
Brilho e fantasia
Mil cores e magia
Uma música de fundo
Sente que é dona do mundo
Já são horas de dormir
Diz-lhe a mãe a sorrir
Espera…
Falta, beijar a fera
Dá um beijo repenicado
Ao júnior apalermado
De gato passou a fera
Felino, sempre quimera
Aos olhos da Beatriz
Aconchego, sono feliz
Adeus pequena princesa
Aos meus olhos fortaleza

Dos teus sonhos aprendiz.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Tempo

Tempo…

Meu amor quem fez o tempo
O que dele fez a espera
Meu amor o tempo é tempo
Que no tempo desespera

Em resumo simplifico
Tudo o que o tempo levou
Tudo aquilo que restou
De um tempo magnifico
Agora em outra era
O meu tempo é gélido
Porque este tempo de espera
É tempo encoberto, enredo

Que se alberga no sentir
De que tardas em chegar
Vejo a vida a fugir
E não sei te procurar.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Tarde

Foge o pensamento, com ele fogem os dias
A idade foge, foge a agilidade
Curiosidade, finda a vaidade
Empalidece em derradeiras alegrias

Os instantes em que o corpo se curva
Nos olhos parados a vida respira
Numa saudade a dor se inspira
Será que vemos que tudo muda

No fim da curva, eu tento esquecer que existe
Mas a neve nos cabelos insiste
Em me dizer, cautela faz o que tens que fazer
Ou então será tarde a meu ver.

Alma

Gosto de ficar parada, sem fazer ou dizer nada
Ali, olhando a planície.
 Para alguns seriam horas de chatice
Outros lhe chamariam burrice
Para o meu olhar enlouquecido
É uma maneira de dizer
Ao Alentejo perdido
Tens tanto que fazer
Para o meu olhar parado
É uma maneira de dizer fado
À extensão de pó asfixiado

Gosto de ficar parada, de falar com os mortos
Que ressuscitam em cada primavera
Depois de um Inverno de espera
São gordas as recordações desta terra
Que a cada Primavera teimam em acenar
Aos olhos de quem não sabe agarrar
Oportunidades vencidas em tempos que teimam em mingar

Levantem-se os mortos, porque os vivos
Há muito que se esqueceram de sonhar

Ai Alentejo meu pedaço de chão
Ai minha terra meu conduto sem pão
Mata-me a fome, mata-me a sede
Diz-me que dias melhores vingarão

Diz-me que a alma dos mortos não vagueia em vão

Palavras ao Vento Suão, Antónia Ruivo